Hoje, no Distrito Federal existem duas realidades: uma é do governo local, que afirma ter controlado a pandemia e diz que houve, inclusive, queda de casos de coronavírus nas últimas semanas. A outra realidade é a dos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), que sofrem com a demora no atendimento e até com a desassistência quando precisam tratar outras doenças além da Covid-19. Nas filas de espera em hospitais e unidades de Saúde, eles são os protagonistas de uma narrativa criada pelo GDF que não apresenta resultados positivos e colocou a capital do País na liderança do ranking de pior desempenho de combate à pandemia em todo o Brasil, segundo dados levantados pelo Centro de Liderança Pública (CLP).
Mesmo para quem tem sintomas de coronavírus, o atendimento não é garantido. Foi o que aconteceu com Bárbara Rinheiro. Dona de casa, ela conta que teve “falta de ar, dor no peito, tremores, suor frio e muita dor de cabeça”. Ainda assim, não conseguiu chegar nem ao consultório médico da UPA do Recanto das Emas. Já na triagem, o diagnóstico foi de “ansiedade”. Sem atendimento, ela voltou para casa ainda com dores no peito. Dias depois, o marido dela foi quem pagou uma consulta e, após uma série de exames, ela descobriu que, na verdade, estava com esofagite erosiva.
“Se fosse pelo atendimento público, estava morrendo de dor até hoje em casa e com o esôfago todo lascado”, lamenta Bárbara. Assim como ela, a técnica de enfermagem Juliana Fontineles também teve de apelar à rede particular para conseguir atendimento. O motivo: somente casos de coronavírus – e olhe lá – estão sendo atendidos na Unidade de Pronto-Atendimento de Sobradinho II. “Precisei de um clínico devido a fortes dores no estômago. E, infelizmente, me foi recusado o atendimento. Sempre essa desculpa. Precisei do postinho para meu filho e falaram que somente estão atendendo casos de urgência devido à Covid-19 também”, lembra.
Juliana ressalta que ela teve condições de pagar uma consulta. No entanto, não é a realidade da maioria. “Graças a Deus tinha condições no momento de arcar com uma consulta particular, mas tem pessoas menos favorecidas que não tem a mesma condição”, afirma. Importante lembra que, de acordo com dados da Codeplan, 70% da população do Distrito Federal depende do SUS para conseguir atendimento médico.
Sem dinheiro para pagar, sem atendimento
E enquanto o governo local reforça que a abertura gradual do comércio não prejudicou o cenário, que já não estava bom, a ausência de atendimento se espalha por todas as regiões administrativas. Em Taguatinga, a Unidade Básica de Saúde (UBS) 1 está com toda a equipe voltada apenas para pacientes com coronavírus ou gestantes. Pelo menos, foi essa a informação repassada à dona de casa Graciele Ribeiro. “Levei minhas filhas para consultar e estou há dois meses tentando um retorno para mostrar os resultados dos exames. Após eu conseguir a primeira consulta, a médica encaminhou uma delas para a nutricionista. Porém, a UBS não aceitou”, diz.
Moradora de Ceilândia, também usuária do SUS, Larissa Araújo recorda que a filha está com uma alergia que, segundo ela, “não passa”. Então, precisa, primeiro, passar pelo posto de Saúde e, depois, ir para o Hospital Regional de Taguatinga (HRT). Entretanto, afirma, “o posto só está atendendo casos de covid-19, como se as outras doenças tivessem sumido”.
Atendimento precisa ser global
A gestão precisa ter uma visão global no que diz respeito ao SUS. A avaliação é do presidente do SindMédico-DF, Gutemberg Fialho. Para ele, “os pacientes não podem ficar sem atendimento quando são portadores de outras patologias que não sejam coronavírus”. Isso porque, aponta, “é uma situação que vai se agravando e até aumentando o número de óbitos evitáveis”.