Dengue: de verão a verão, sem prevenção

Verão, inverno, primavera e outono. Essas são as quatro estações do ano. Sim, todo mundo sabe. Mas não é por acaso que nós começamos este artigo por aí. Com elas variam os padrões climáticos, os ciclos da própria natureza: chuva, calor, seca etc. Para a agricultura, por exemplo, elas marcam o tempo de plantar e o de colher. Na pecuária, alertam para a disponibilidade de alimento para o gado. Poderíamos dar uma infinidade de outros exemplos.

Para a área da saúde, não é diferente: essas subdivisões climáticas têm extrema importância. Por meio de dados sobre cada uma delas, é possível prever padrões das chamadas “doenças sazonais”, entre elas a dengue e as doenças respiratórias que costumam lotar pediatrias entre outono e inverno. Com base nisso, cabe às gestões o planejamento, que inclui medidas de prevenção e combate. O que claramente não ocorre no Distrito Federal.

Nas três primeiras semanas de janeiro, foram notificados 16.628 casos prováveis de dengue. Se comparado ao mesmo período do ano passado, que registrou 1.370, houve um aumento de 646%. Como isso acontece, sendo que sabidamente o período de maior transmissão da doença coincide com o verão, com suas chuvas e temperaturas elevadas? Não há justificativa plausível para a proporção deste problema. O fato é que o governo local não investe em prevenção e deixa para a última hora as ações de combate: muitas delas pró-forma, porque não solucionam a proliferação do mosquito Aedes aegypti.

Segundo denúncia feita ao SindMédico-DF, outro agravante para a situação foi a dispensa dos 600 agentes de vigilância ambiental de contrato temporário. Isso explica muita coisa. Em tempo: esses profissionais atuam, em especial, no combate aos vetores de doenças como dengue (mosquito Aedes aegypti). Agora, depois de feito o estrago, são anunciadas “tendas” para atendimento à população em 9 regiões administrativas. Isso com dois óbitos confirmados pela doença e 12 em análise, sem contar as subnotificações. Saúde é prevenção! Não se espera o mal maior acontecer para, então, definir ações de combate.

Como afirmei no início deste artigo, a “sazonalidade” climática define a época de maior incidência de determinadas doenças. Por isso, repito, é possível, sim, prevenir e combater sem esperar pelo caos. O GDF precisa ser responsabilizado pela epidemia de dengue. Oras, não estamos falando de algo que não ameaça vidas. A dengue mata! E o mesmo ocorre com o chamado vírus sincicial respiratório (VSR), que, todos os anos, entre outono e inverno, tem lotado as pediatrias dos hospitais e unidades de saúde do Distrito Federal. Será que este ano será diferente dos anteriores? Você está sabendo de alguma ação de combate à doença? Nem eu.

No ano passado, em abril, foi divulgada a criação de um grupo para enfrentamento de doenças respiratórias em crianças no DF: no meio do caos, como o da dengue, agora, criado em janeiro. Mas, desde então, não se sabe o que o grupo faz, fez ou irá fazer. Não se fala em contratação efetiva de mais pediatras, em valorização dos servidores e em organização da estrutura da SES-DF. Contratos temporários são “soluções” paliativas. Não se combate endemias, epidemias ou pandemias com uma estrutura mínima: precarizada e negligenciada.

O resultado da ausência de prevenção à dengue no DF é este: emergências de hospitais públicos e privados superlotadas. O cidadão agoniza nas filas, os profissionais da saúde sofrem com a sobrecarga e os marqueteiros correm para criar narrativas que escondem a realidade, transferindo a culpa para as chuvas. Como, se elas ocorrem todos os anos? A propaganda, no GDF, “é a alma do negócio”. Só que, vamos ressaltar, gestão pública não é um negócio. Saúde pública é coisa séria. E a política do improviso não funciona.

Como será no ano que vem? Uma nova explosão de casos de dengue? Chega, né?! Mais uma vez, pergunto: cadê o planejamento? Em breve, as emergências e UTIs pediátricas começarão a lotar, com a sazonalidade das doenças respiratórias. O que está sendo feito? As estações não irão mudar. Podem ser ainda mais rigorosas. Vamos ter, a exemplo da dengue e do ano passado, mais um cenário de caos na saúde? De quem é a culpa: das estações, dos vírus ou da gestão?