As Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) pediátrica e neonatal públicas e privadas do Distrito Federal estão em colapso. A sazonalidade das doenças respiratórias, que começou mais cedo e em maior intensidade do que nos anos anteriores provoca uma crise na pediatria, faz se repetir um quadro que faz lembrar a pandemia da covid-19. O fato de serem crianças as vítimas torna a situação mais preocupante.
Este ano já ocorreram 18 óbitos infantis em unidades de saúde do DF. Além das UTIs colapsadas, emergências e enfermarias pediátricas estão superlotadas. A quantidade de especialistas na rede pública de saúde é insuficiente para um atendimento mais ágil, tanto quanto as instalações para acolhimento e internação do público infantil se mostram insuficientes. Questões como falta de equipamentos de proteção individual e de respiradores voltam a preocupar.
Em decorrência disso, aumenta o adoecimento dos profissionais de saúde e o descontentamento dos familiares gera situações de desespero e descontentamento, potencialmente desecadeadores de eventos de agressão e violência nas unidades de saúde.
Por isso, no dia 18 de abril, o Sindicato dos Médicos do Distrito Federal (SindMédico-DF), reuniu pediatras, neonatologistas e médicos de família e comunidade que estão na linha de frente da assistência pediátrica, nos três níveis de complexidade, para discutir a situação com a secretária de Saúde, Lucilene Florêncio, integrantes da equipe da gestão da Secretaria de Estado de Saúde do DF (SES-DF), representantes das demais entidades médicas e dos órgãos de controle.
Problemas locais e estruturais
Problemas pontuais, como equipamentos sem manutenção também foram apontados e tumulto provocado pela presença de uma parlamentar em atividade de vistoria e absenteísmo elevado por adoecimento.
A deficiência nos processos internos de comunicação foi citada como agravante dos problemas e a ineficiência da prestação de informação, pela SES-DF, à população, como onde e quando procurar atendimento também foram consenso entre os médicos presentes.
Explicações e justificativas da gestão
A secretária Lucilene Florêncio citou as medidas adotadas para o enfrentamento à sazonalidade:
Antecipação da campanha de vacinação contra a gripe no DF;
A implementação da Rota Rápida para redirecionamento de pacientes de menor gravidade para unidades com menor demanda;
Treinamento de 700 profissionais que atuam na Atenção Primária à Saúde para o atendimento de crianças com síndromes respiratórias;
O início do serviço de telemedicina, por especialistas do Hospital da Criança de Brasília, para suporte à UTI pediátrica do Hospital da Região Leste, no Paranoá;
A abertura de novos leitos de UTI pediátrica em unidades públicas de saúde;
Contratação de leitos privados para suprir o déficit nos hospitais públicos;
A tentativa de contratação de pediatras no concurso público de 2022 – medida que não tem alcançado sucesso pelos baixos salários oferecidos;
A extensão de horário de 14 unidades básicas de saúde até as 22h;
Criação do Centro de Operações de Emergências Pediátricas (Coep);
A secretária também comentou as limitações da SES-DF em relação ao transporte sanitário (ambulâncias), restrito a unidades próprias a ao Serviço Móvel de Atendimento de Urgência (SAMU), o que implica no deslocamento de médicos das unidades de saúde já desfalcadas para acompanhar pacientes graves em remoções.
Sugestões dos médicos para superar a crise da pediatria
Uma representante da equipe pediátrica do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB) apresentou uma carta na qual se faz o relato das dificuldades enfrentadas naquela unidade de saúde e sugestões a serem avaliadas pela SES-DF:
Em curto prazo
Reforço da segurança, principalmente na entrada e saída de pacientes;
Abertura de novos leitos de UTI, especialmente para pacientes menores de 28 dias de vida ou autorização para que as UTIs pediátricas aceitem esses pacientes, tendo em vista que essa faixa etária é a que permanece mais tempo aguardando vagas;
Revisão do risco de insalubridade de nível médio para máximo;
Em médio prazo
Treinamento de enfermeiras, médicos de família e comunidade e pediatras, tanto para identificarem fatores de risco e gravidade quanto para orientarem os pacientes a quando acessar um serviço de emergência e o uso de medicamentos básicos na pediatria;
Restabelecimento do atendimento pediátrico em hospitais, UPAs e postos de saúde.
Em logo prazo
Campanhas informativas sobre a sazonalidade, vacinação, alimentação e educação em saúde;
Planejamento para a próxima sazonalidade.
Além dessas sugestões, também foi destacado que o fluxo de pessoas nas unidades de saúde aumenta em função de pedidos de atestado médico para justificar faltas escolares, o que provoca maior tumulto e demanda a atenção dos profissionais, mesmo nos casos em que as crianças ficam em casa, recebendo cuidado dos familiares.
A sugestão foi estudar a dispensa do atestado médico pelas escolas neste período crítico. A dificuldade é que a justificativa das faltas é indispensável no caso das famílias beneficiadas pelo Bolsa Família.
Crise na pediatria: o DF tem pediatras
A secretária de Saúde se comprometeu a trabalhar pelo aumento da segurança nas unidades de saúde. A presidente da Sociedade de Pediatria do Distrito Federal, Dra. Renata Seixas, destacou ser necessário desmistificar informações incorretas que circulam atualmente: a primeira questão é que não há evidências de que o vírus sincicial esteja mais forte. Ela também destacou que é necessário deixar claro que o DF tem pediatras em grande quantidade, mas não contratados pela SES-DF, o que motiva a crise na pediatria.
A presidente do Conselho Regional de Medicina do DF, Dra. Marcela Montandon, corroborou essa informação: “a pediatria é a segunda especialidade com o maior número de profissionais entre os médicos do DF com registro no CRM”, informou.
Para o presidente do Sindicato dos Médicos do Distrito Federal (SindMédico-DF), Dr. Gutemberg Fialho, a reunião foi importante para que os profissionais expressassem suas aflições e demandas diretamente à secretária de Saúde. “É necessário e urgente que o Governo do Distrito Federal crie as condições necessárias para que o serviço público de saúde volte a atrair médicos, porque, com a oferta atual de condições salariais e de trabalho, não há condição de melhorar a qualidade da oferta de assistência à saúde da população”, afirmou Dr. Gutemberg.