Servidores pagarão a conta pela manutenção de jornadas

A contragosto, parlamentares votam projeto para não prejudicar usuários e estudantes

A Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) aprovou, a contragosto, com 20 votos a favor e quatro deputados distritais ausentes, o Projeto de Lei (PL) 1.992/2018, para evitar que a Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS) e serviços de saúde diversos parassem a partir de junho.

Em vez de encaminhar à CLDF um projeto específico para tratar da questão das jornadas de trabalho, o governador Rodrigo Rollemberg mandou um projeto que cria a TPD – remuneração por trabalho em tempo definido. Esse novo arranjo jurídico da lavra do secretário Humberto Fonseca é um dispositivo pelo qual se pretende diminuir o gasto com horas extras – estima-se economia de 39%. Na prática, é uma hora extra mais barata, que desvaloriza o trabalho do servidor, dando mais um alívio financeiro para o atual governo.

Estima-se que os médicos, porque fazem menos horas extras, não serão tão afetados. O presidente do Sindicato dos Médicos do Distrito Federal (SindMédico-DF), Gutemberg Fialho, que sempre se opôs à prestação continuada de horas extras no lugar da realização de novas contratações, enxerga na TPD mais um motivo para que os servidores da saúde evitem estender suas jornadas de trabalho além das normais.

“Para os profissionais de outras carreiras da saúde o impacto financeiro será maior e pode fazer com que a TPD vire um tiro pela culatra. O tempo é que dirá”, aponta Dr. Gutemberg.

Alimentando o caos para colher benefícios questionáveis

A frase mais repetida para uma plateia lotada de estudantes não sem razão ansiosos foi “é um projeto muito ruim, que só vai ser aprovado para não prejudicar os estudantes e o atendimento à população.”

A deputada Celina Leão destacou a preocupação de que a lei possa ser alvo de questionamento por eventual inconstitucionalidade. Entre os aspectos que despertam dúvida está o fato de, na prática, a TPD substituir o instituto da hora extra.

O inciso XVI do Art. 7º da Constituição Federal determina que a remuneração do serviço extraordinário deve ser, no mínimo, a 50% superior ao valor da hora de trabalho normal. A TPD terá valor fixo para qualquer servidor de mesmo cargo, calculado em função do número de horas realizadas, correspondendo ao vencimento básico do último padrão vigente desse cargo, com adicional de 25% em finais de semana e feriados e o adicional noturno previsto em lei.

O deputado Chico Vigilante afirmou que isso, no mínimo, vai criar uma enxurrada de ações trabalhistas. “E os servidores vão ganhar todas. O que estão fazendo é criar um passivo trabalhista para o próximo governo”, afirmou.

“No fim das contas, a saída do governo foi uma forma de reduzir gastos, mais uma vez cortando da remuneração dos servidores para resolver o problema desta gestão, sem garantia de segurança em longo prazo”, avalia o vice-presidente do SindMédico-DF, Carlos Fernando.

Enquanto isso, no TCDF…

Antes que o governo encaminhasse o PL 1.992/18 para a CLDF, o SindMédico conseguiu convencer a presidência do Tribunal de Contas do Distrito Federal a desarquivar o processo no qual foi dada a decisão que limitou em 12 horas as jornadas de trabalho por plantão, restringiu as horas extras em duas por dia e estabeleceu intervalo de pelo menos 11 horas entre as jornadas de trabalho.

No pedido de revisão, o sindicato apontava aspectos que ficaram pouco claros na defesa feita pela Secretaria de Saúde, que nem uma sustentação oral chegou a fazer. “Deixaram a situação chegar a um nível caótico, criaram comoção e manipularam a opinião pública para aprovar um projeto que serve mais para resolver um problema pontual do atual governo, com risco de retrocesso se os órgãos de controle considerarem que o arranjo é ilegal”, avalia Dr. Gutemberg. Uma liminar com efeito suspensivo levaria tudo à estaca zero.